SURPREENDENDO JESUS

“Ouvidas estas palavras, admirou-se Jesus dele e, voltando-se para o povo que o acompanhava, disse: Afirmo-vos que nem mesmo em Israel achei fé como esta. ” (Lc. 7.9)


    Como assim o Cristo sendo surpreendido e se admirando de algo? Sendo ele Filho de Deus, portanto, 100% Deus, embora também 100% homem; o que o surpreenderia? Seria uma antropopatia (atribuição de sentimentos humanos a Deus)? Alguma semelhança com o antropomorfismo? Devemos ter cuidado para a hermenêutica não excluir a simplicidade do evangelho. Admirar, segundo o Léxico de Strong do grego mais utilizado, significa maravilhar-se ou surpreender-se. No Moderno Dicionário Michaelis, adquiri outros sentidos, como apreciar, respeitar, contrair simpatia, espanto, etc. 

    Em dois momentos no Novo Testamento há menção do Senhor Jesus se admirando: ao constatar a incredulidade de seus irmãos, familiares e conhecidos de infância (Marcos 6.6) e ao ouvir relato da fé de um gentio (Lucas 7). Observamos situações bem antagônicas, a primeira certamente de tristeza, afirmando até que “não há profeta sem honra, senão na sua terra, entre os seus parentes e em sua casa”(Lc 4.24). E a segunda de alegria; conforme discorreremos abaixo.
    
    Entrando em Cafarnaum, cidade situada ao norte do mar da Galileia, local onde mais milagres operou, Jesus foi abordado por alguns judeus para que atendesse a solicitação de um centurião romano (comandante de cem homens); este intercedendo pelo criado enfermo jaz em sua casa. Já habituado em socorrer o povo, certamente também o atenderia. Porém, a história desse milagre finalizaria com uma forte declaração do Mestre de grande admiração pela fé daquele militar, o qual apresentou um nível de fé ainda não visto na nação de Israel. O que diferenciou essa fé? 

    Embora o elemento que mais caracterizou a consistência da crença do centurião tenha sido a noção da autoridade, lembrando o velho ditado “manda quem pode obedece quem tem juízo”, não podemos desconsiderar valores agregados à sua fé que, de forma tão inusitada, proporcionou o elogio do Filho de Deus. Biblicamente, só existe um lugar que defina a palavra Fé; a saber: “Ora, a fé é o firme fundamento das coisas que se esperam, e a prova das que não se vêem” (Hb 11.1). A palavra fé deriva do hebraico “emunah” significando crer e obedecer; motivo pelo qual “a fé sem obras ela é morta”. A fé conduz à fidelidade. Neste sentido não está condicionada ao legalismo de obter a salvação por práticas da religião, mas sim pela fé que frutifica. Afinal, o escritor Aos Hebreus identifica: “ olhando firmemente para o Autor e Consumador da fé, Jesus, o qual em troca da alegria que lhe estava proposta, suportou a cruz...” (Hb 12.2a).

    Qual a grande riqueza da experiência passada pelo centurião? Podemos perceber características e valores que vem ao encontra da vontade soberana do Pai e servem de exemplo para os que, verdadeiramente, querem agradar a Deus. A começar pela mencionada fé associada com a autoridade. Não é uma “fezinha” de que alguma coisa possa acontecer pela misericórdia de Deus, mas plena convicção. Um conhecimento atrelado ao reconhecimento do poder da palavra de quem realmente tem autoridade: “porém manda com uma palavra, e o meu rapaz será curado” (Lc 7.7b). 

Naquele momento já havia sido descoberto diante de Jesus alguns traços do caráter ilibado do solicitante. Não uma busca pelo mérito, tampouco de condições para uma aceitação da intercessão, muito além; um pacote de quem, independentemente de sua origem nacionalista, um gentio, guardava princípios surpreendentes e se notabilizaram:

1- Um homem afeiçoado aos humildes (Lc 7.2) – Buscou auxílio divino para curar seu criado. Não era um parente, mas apenas um servo; talvez de muitos que moravam em sua residência, conforme costume da época. Abençoar aqueles que não podem retribuir é sinônimo de solidariedade e amor.

2- Um homem de bons relacionamentos (Lc 7.3,4) – Embora não havendo registros que o mesmo cultuasse o Deus de Israel, proporcional um local para a adoração. Seu testemunho de vida falava por si só. Em um tempo atual no qual muitos procuram honras e reconhecimentos por intermédio das cadeiras que ocupam, aquele expressava ações que evidenciavam suprir o próximo sem, contudo, buscar honra para si.

3- Um homem amigo dos judeus (Lc 7.5) – Uma amizade manifesta, não só aos religiosos de Cafarnaum, mas que se estendia ao povo.  Um sentimento profundo de amizade normalmente caminha lado a lado com o respeito. 

4- Um homem humilde (Lc 7.6) – “porque não sou digno de que entres em minha casa”. Nunca é demais lembrar que a humildade não é sinônimo de auto estima baixa e nem de autocomiseração, características estas que levam à murmuração e, posteriormente, incredulidade. Porém o considerar-se indigno disposto a humilhar-se para ser atendido remete ao ladrão crucificado com Jesus que mesmo considerando seus erros, proferiu: “Lembra-te de mim quando entrares no teu reino”(Lc 23.42b).

Algumas vezes motivamos aos irmãos dizendo que Deus vai surpreendê-los. Decerto Ele faz muito mais do que pedimos ou pensamos; no entanto ignoramos que também podemos fazer mais do que temos feito e saltar da mesmice da religiosidade para atitudes surpreendentes que venham diferir da grande maioria. Conforme declarou João Batista: “ É necessário que Ele cresça e eu diminua” (Jo 3.30).
                                                                            
                                                         Fraternalmente,
                                                                              Pr. Ednilson Pedro Sobrinho

    

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