COM QUEM VOCÊ PODE CONTAR?



Atendendo a pedidos, meditaremos sobre este tema que foi abordado, recentemente, em uma de nossas ministrações. Relembrando o sofrimento da oração solitária que passou Jesus no Getsêmani, é inevitável não deixar de perceber a atitude de alguém que se decepciona com seus mais preparados e melhores amigos, os quais, comprovadamente, foram privilegiados dentre os outros seguidores. Ainda que considerando a sua onisciência enquanto Deus filho, sob a sua natureza humana, pairava, certamente, um sentimento natural de certa expectativa que foi frustrada.

Pedro, Tiago e João tornaram-se mais conhecidos que os demais pelas suas constantes citações, sobretudo na companhia do Mestre. Coincidentemente, por três vezes anteriores foram separados dos demais para viverem alguma experiência sobrenatural: quando da chamada “pesca maravilhosa” (Lc 5); na ressurreição da filha de Jairo (Lc 8); e na gloriosa transfiguração no Hermon (Lc 9). Não há uma explicação plausível de meritocracia para justificar tal escolha; sem querer depreciá-los, podemos observar que o mais elogiado dentre os doze apóstolos foi Natanael, aquele sobre o qual declarou Jesus que era um verdadeiro israelita e nele não havia nenhum dolo (Jo 1.47). Questiona-se, também, a ausência de André, irmão de Pedro, visto que o quarteto estava sempre junto devido questão profissional, eram sócios na atividade pesqueira.

A causa de maior perplexidade em face a decepção no momento mais importante do ministério do Salvador, dar-se-á na constatação que os três receberam mais atenção, ensinamento e visibilidade que os outros nove conservos. Por vezes, nem sempre os mais preparados darão respostas do investimento que receberam. Se considerarmos que Pedro teve importante missão no evangelismo aos judeus e, posteriormente, aos gentios; e que João, o mais longevo, responsável por dois registros imprescindíveis (seu evangelho e Apocalípse), ratificaríamos a necessidade de passarem por aquele traumático episódio; no entanto, Tiago, primeiro apóstolo mártir, não deixou um grande legado, exceto sua morte.

Procurando um local para fortalecimento por intermédio da oração, o Messias os convocou para um momento de grande angústia e clamor, visto que sabia ser a ocasião derradeira de comunhão com seus irmãos antes da sua morte. Aquele jardim situado no arredor de Jerusalém, ao pé do monte das oliveiras, seria propício para um fechamento de um curso que durou três anos e seis meses. Tudo o que pediu foi que estivessem vigiando em oração, porém não foi atendido. Ele contava com aqueles três homens ao ponto de orientar que os outros apóstolos ficassem assentados enquanto seu seleto grupo o acompanhasse. 

Como se fosse necessário a ênfase do número três, também fora o número de vezes que o Senhor retornou à presença deles para observar, com tristeza, que não atenderam sua expectativa, dormiram. O profeta Daniel pode contar com seus três fiéis amigos. Samuel, após o terceiro chamado de Deus recorreu a Elí que o orientou a atender na quarta vez. Três sentenças foram oferecidas a Davi por proceder indevidamente na contagem do povo. O não menos famoso e juiz Sansão subestimou a sutileza de Dalila e dos filisteus até que na quarta oportunidade sucumbiu. Que diremos de Paulo orando por três vezes na prova do “espinho na carne” sem ser atendido?

Querer e não poder contar com alguém nem sempre significa demérito dos ausentes. Em alguns momentos, o que pode parecer um abandono é uma luta que já foi determinada como nosso deserto, daquelas que você pensa estar sozinho e é carregado por Deus, como no poema “Pegadas na areia”. Em outros, de fato, pode ser um sinal de que houve ilusão na eleição; ainda pode-se conjecturar que não seria o momento daquelas pessoas devido a estrutura. Mas em todas as circunstâncias vemos a comprovação da nossa total dependência de Deus.

Quantas vezes contamos com alguém que nos decepcionou? Quantas vezes alguém contou conosco e teve o mesmo sentimento? Quantas vezes você foi surpreendido positivamente com quem não contava?  Quantas vezes o Senhor contou conosco e fomos relapsos ou omissos? A parte mais maravilhosa do episódio no Getsêmani ocorreu na última frase de Jesus: “Levantai-vos, vamos! Eis que o traidor se aproxima” (Mt 26.46). Parafraseando: Tudo bem que vocês falharam, mas ainda conto com vocês. Que o Pai das Luzes ilumine nosso entendimento a fim de que estejamos sempre de pé.




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